Queimadas e estiagem na região do Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu
A BV
em Dia traz hoje uma discussão de grande relevância no que se refere à área
ambiental da Baixada Fluminense do Estado do Rio de Janeiro. Em visita ao
Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu (PNMNI), a equipe BV em Dia, em
parceria com a doutoranda do Programa de Pós-graduação em Geografia da UERJ,
Flávia Lopes (orientadora Profa. Nadja Costa), realizou uma
entrevista exclusiva com o gestor do Parque, Edgar Martins, onde o mesmo falou
sobre um problema que tem ocorrido na área e levado o fechamento do Parque para
o uso púbico.
O
que tem contribuído ao fechamento do PNMNI é a estiagem que vem atingindo o
local, onde o baixo índice de chuvas, em conjunto com a degradação do solo,
dentre outros fatores, refletem diretamente no nível d’água dos rios e,
consequentemente, da represa Epaminondas Ramos, localizada na entrada do Parque.
O mesmo, além de ter o banho como um dos principais atrativos à visita abastece
cerca de 2000 famílias do bairro K-11, em Nova Iguaçu. Portanto, a necessidade em
fechar o Parque para visitações está relacionada com o comprometimento da
qualidade da água que serve de abastecimento para as famílias locais, já que
como o nível d’água está baixo, a renovação da água fica comprometida.
Represa Epaminondas Ramos, foto tirada em 1/10/2014
Coincidente
a estes fatos, as queimadas realizadas por trabalhadores rurais, na zona de
amortecimento do Parque (2 km do seu entorno), para a renovação do pasto,
intensificam ainda mais a degradação ambiental da área, uma vez que a vegetação
e o ar seco contribuem diretamente para que o fogo se alastre mais rápido, e
sem controle, acabe acidentalmente atingindo alguma parte do Parque.
Abaixo,
segue algumas palavras do gestor do Parque, Edgar, sobre essas ocorrências:
Equipe BV em Dia: Em relação às queimadas, como o parque
detectou tal problema?
“Edgard:
Isso é todo o ano, no período de estiagem. Grande parte das unidades de
conservação que tem na sua área de amortecimento pasto sofre com a queimada,
porque donos de boi colocam fogo no pasto pra poder renovar, o caçador de
pássaro coloca fogo pra poder tirar o alimento do pássaro e ele vir muito mais
rápido nas armadilhas”
Quanto
às ações do Parque em relação à detecção de focos de incêndio, o gestor aponta
o contato imediato ao corpo de bombeiros da região, como a solução, porém, de
acordo com ele, em média 80% das chamadas não são atendidas.
Equipe
Bv em Dia: Quais as consequências você pode nos relatar das queimadas?
“Perda ambiental, que a perda é muito
grande. Além de animais que morrem queimados, vão perdendo seu habitat e acabam
migrando pra outro lugar que esteja mais preservado...”
O
Gestor ressalta, também, a importância do manejo, ou seja, manutenção das
trilhas do Parque, pois estando limpas e bem cuidadas, o fogo não consegue
ultrapassar para outras regiões, além de facilitar a locomoção até focos de
incêndios.
Fato
é que para que este patrimônio possa continuar a existir, oferecendo seus
atrativos e servindo como fonte de pesquisa para diversos estudantes, a
conscientização quanto às questões mencionadas nesta entrevista se faz
primordial.
A
Equipe BV em Dia agradece ao gestor Edgar Martins do PNMNI e sua equipe, pela
recepção e disponibilidade para a realização da entrevista. Dessa forma,
frisamos aqui a importância em discutir e tornar pública questões sociais e
ambientais envolvendo o espaço da Baixada Fluminense, levando cada vez mais ao
internauta informações atualizadas!
Transcrição PNMNI Gestor: Edgard Martins.
P.
BV em Dia 1) Em relação à queimadas, como o parque detectou tal
problema?
Edgard:
Isso é todo o ano, no período de estiagem. Grande parte das
unidades de conservação que tem na sua área de amortecimento pasto
né, sofre com a queimada, porque donos de boi colocam fogo no pasto
pra poder renovar, o caçador de pássaro coloca fogo pra poder tirar
o alimento do pássaro e ele vir muito mais rápido nas armadilhas.
Então essas duas questões que as unidades acabam sofrendo, porque o
que acontece, não tem limite. Ele coloca e não se consegue limitar
o fogo de chegar na unidade. Quando você consegue detectar ele ainda
longe...
Henrique:
na zona de amortecimento então é onde está o grande problema?!
Edgard:
É onde está o grande problema!
Patricia:
Então a zona de amortecimento faz parte do plano de manejo do
parque?
Edgard:
Sim, são os 2 Km de intervenção direta.
Patrícia:
A então o parque, vamos dizer assim, é responsável por essa zona
também?
Edgard:
Sim, sim! E essa zona de amortecimento também está dentro da APA
Estadual, que é a APA Gericinó Mendanha, logo uma outra parte de
amortecimento também ta dentro do parque Estadual do Mendanha, que
acaba sobrepondo ai o parque também cuida, o Parque Estadual do
Mendanha também cuida desse lado. O meu grande problema hoje é a
área norte do parque, a área norte você olhando de Nova Iguaçu é
toda a serra de Madureira, é o grande problema da unidade hoje,
tanto pras queimadas, quanto pra tudo isso que vem acontecer aqui a
entrada é pela serra de Madureira, porque lá por enquanto a gente
não tem esse controle. Mesmo com a guarda patrulhando, tem um
momento que não dá. Por exemplo, eu vou embora as 17 hrs, então o
cara sabe que eu vou embora, ele deixa o que ele tem pra fazer depois
das 17 hrs.
P.
BV em Dia 2) Qual a principal atitude tomada em relação às
queimadas?
Edgard:
Quando elas são detectadas a gente consegue combater. No primeiro
momento, a gente liga pro corpo de bombeiros.
Henrique:
É isso que eu ia te perguntar, se era por conta própria, mas tem
ligação com o corpo de bombeiros?!
Edgard:
Tem, tem ligação com o corpo de bombeiros, nem sempre eles atendem.
80% eles não atendem
Henrique:
ué Edgar?, mas poxa é uma área de preservação, porque que não
atendem?
Patrícia:
Não existe uma equipe no próprio parque?
Edgard:
Não, no parque existe sim! Existe uma equipe que combate, só que o
efetivo não é grande, então dependendo da proporção do incêndio
não dá conta! Eu presenciei dos dois dias aqui, no primeiro dia a
gente não deu conta. O segundo ele tomou uma proporção tão
grande, que a secretaria ligou pro prefeito, o prefeito ligou direto
pro comandante e ai deu aquela repercussão, ai o bombeiro veio com
helicóptero, jogou água da represa e ai a gente conseguiu controlar
ne esse fogo, mas geralmente o corpo de bombeiros não vem e nem tem
se preocupado, porque a corpo de bombeiro é preparado pra apagar o
fogo? Sim, o triângulo do fogo é um só, porém o comportamento
dentro da floresta é diferente. Se você cortar qualquer lado do
triângulo dentro da mata é muito diferente, porque o vento muda
toda hora, o combustível vareia o tempo todo, entendeu, então é
muito difícil. Nem sempre o cara que ta preparado pra combater o
fogo na área urbana, num prédio, ele ta preparado pra floresta.
Henrique:
e aqui unicamente de helicóptero né, ou sobre (...? não entedi)
Edgard:
Na floresta sim, só helicóptero. No pasto ainda consegue com o
abafador, a equipe combate direto, mas dentro da mata é mais
difícil.
Bolsista
Patrícia: E assim, consequências que você pode nos relatar dessas
queimadas?
Edgard:
Perda ambiental né, que a perda é muito grande. Além de animais
que morrem queimados, vão perdendo seu habitat e acabam migrando pra
um outro lugar que esteja mais preservado (....) já vai se formando
ali pra poder, pra mata se regenerar novamente acaba se perdendo, por
exemplo no lado da Varginha (?) aqui tem uma floresta ali, uma mata
secundária inicial que o fogo bate , seca aquela ponta todinha. No
outro ano aquela parte que ta seca vai e entra mais um pouco o fogo.
Ai a gente vai focando muito ali, porque senão cada ano que o fogo
vir encostando você só vai perdendo floresta.
Henrique:
Então essa é uma medida que visa a preservação?
Edgard:
O que, o combate?
Henrique:
é o combate!
Edgard:
Sim! Sempre, é diminuir ao máximo a perda ambiental no lugar, a
perda de floresta, de biodiversidade em geral.
P.
BV em Dia 3)
Há algum
projeto organizado pelo Parque para que as
áreas
atingidas sejam recuperadas?
Edgard:
Sim! Tem duas coisas. Uma é o manejo que a gente faz aqui, um
mutirão. Então esse mutirão faz o que? Quando a gente recupera uma
trilha, limpa, deixa ela bonitinha, ela serve tanto de (...) para o
fogo não ultrapassar pra dentro da unidade quanto de um caminho
rápido, porque o caminho fechado ele dificulta essa locomoção da
equipe até o incêndio, então quando a gente faz esse trabalho de
manejo de trilha, pra manter a trilha sempre limpa ela funciona tanto
pra facilitar o acesso do brigadista na hora de combater o fogo
quanto o fogo não ultrapassa, porque a trilha ta limpinha aí o fogo
bate ali apaga e não passa pro outro lado. Nós temos um projeto
agora através de uma compensação do Arco Metropolitano de ta
recuperando todas as áreas degradadas hoje dentro do Parque que
totaliza 59 Hectares.
Henrique:
Eu ia até te fazer uma pergunta Edgar, não tem no nosso roteiro,
mas como você citou o arco metropolitano vo fazer até uma ligação
com o próprio mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense. Existe
alguma outra medida compensatória que o arco metropolitano esteja
propiciando por estar possivelmente degradando uma área do mosaico,
ou então do parque?
Edgard:
Não no nosso. Mas sim. O impacto que já foi gerado, porque o arco
já está funcionando, o trecho que corta Nova Iguaçu ele ta
acontecendo sim. Não só o parque, mas nós temos a compensação de
120 hectares. Ta incluso a questão dos 59 hectares, uma manutenção
de 4 anos desse reflorestamento mais a construção de um outro
dentro desses 120 hectares do parque. Mas ai nós temos uma unidade
APA morro agudo que ta sendo reflorestada também que tem um projeto
de um parque botânico, isso tudo com verba do arco metropolitano
recuperando áreas degradadas.
P.
BV em Dia 4) Há algum plano emergencial organizado pelo Parque em
caso de queimadas?
Edgard: O plano emergencial é
o patrulhamento que os funcionários estão fazendo diariamente. São
duas equipes, que trabalham no esquema 12/36 horas, que ficam rodando
pelo Parque. O período de fogo é o período que a umidade relativa
do ar esta baixa, que é entre meio dia e entre três e meia e quatro
da tarde. Esse é o período onde começam sempre os incêndios
florestais, ao menos os maiores, então este é o período em que a
galera fica mais atenta, o tempo todo olhando, para conseguir
detectar este incêndio no inicio. E também para conseguir flagrar
alguém né, se a gente conseguir pegar alguém colocando fogo,
levamos a delegacia e vai preso, porque é um crime ambiental,
previsto na lei 9.605.
P.
BV em Dia 5) Quais são os principais desafios enfrentados pela
administração do Parque?
Edgard:
Eu acho que o maior desafio hoje da unidade é conseguir fazer a sua
parte social, porque um dos objetivos do plano de manejo é a parte
ecológica, e tem a parte social. A parte Ecológica a gente esta
cumprindo, porque o parque quando foi criado haviam 32 sítios, e se
você for nessas áreas onde havia esses sítios, que eram grandes
áreas degradadas, que haviam plantações de banana, hoje você vê
a mata sozinha, sem ninguém. O ser humano não colocando a mão ela
sozinha se recupera. Agora, a parte social, que é o pertencimento da
comunidade com a unidade, e aí sim quando a população tiver o
pertencimento, ela irá parar de colocar fogo, porque sabe que se
colocar fogo, poderá chegar ao Parque. Os caçadores vão parar de
caçar pássaros, porque sabe que estes tem uma função dentro da
unidade, e ele tem este pertencimento com a unidade, então se ele
caçar, ele sabe que ele esta criando um desequilíbrio em uma das
funções ecológicas. Logo, para mim, hoje, o maior desafio é
cumprir a essa parte social, realizar esse equilíbrio da população
com a unidade, que hoje ainda não conseguimos chegar a um nível
considerável. A gente consegue realizar com o pessoal que faz
caminhada, com as escolas que a gente vai entrando, mas a grande
massa, infelizmente ainda não conseguimos realizar esta parte
social, que esta vinculada a questão ambiental.
P.
BV em Dia 6) Quais são os principais atrativos e atividades que o
Parque oferece?
Edgard:
O Parque ele é aberto de Terça a Domingo, de 8 às 16hrs para
visitação pública, banho de cachoeira, trilhas. Porém, na parte
da manha entre 6 e 8 da manhã é aberto para caminhada, o pessoal
faz só caminhada, para os que praticam Mountain Bike, nesse período
você pode fazer, e agendamento, você pode estar agendando também
para estar visitando o parque com monitor. Por exemplo, o visitante
quer conhecer o vulcão, que é uma trilha que depende de um monitor
para estar te acompanhando. Outro exemplo é as minas do clube de
campo, que existe dentro da unidade, que também precisa de um
monitor, então somente com agendamento. O Parque possui duas
temporadas. Temos a temporada de montanhismo, onde exploramos muito
esta questão das trilhas, estimula o pessoal a estar andando nas
trilhas. Esta temporada vai de primeiro de maio ate o verão. Quando
entra o verão, ai já muda a temporada, e os visitantes querem tomar
banho de cachoeira, se refrescar mesmo.
Patrícia:
E se uma pessoa chegar com um grupo de amigos querendo fazer uma
trilha? Tem que fazer o agendamento, se comunicar?
Edgard:
Não, ai o Parque está aberto de terça a domingo de 8 às 16 horas,
entendeu?. Ele só será orientado sobre se conhece a trilha que
deseja fazer, sendo sugerido que não vá para pontos onde não
conheça, porque há riscos de se perder, então ele é orientado na
guarita quanto ao roteiro do qual ele quer escolher. E agora estamos
com um projeto, eu já ia me esquecendo, de sinalização da unidade.
A nossa sinalização é toda precária, e não diz nada. Então nós
pegamos um modelo do Inea que está dando super certo nos parques
estaduais, e vamos aplicar no Parque, que é um modelo com um mapa,
onde você vai se localizar. Você vai estar em determinado ponto, e
vai saber no mapa onde você esta dentro da unidade.
Patrícia:
É, nós pegamos aquela trilha, que a Flávia até tirou foto, ela
tinha um pequeno mapa marcando o caminho...
Henrique:
É a da Varginha, não?
Patrícia:
... Isso, a da varginha, que tem até o nível de dificuldade da
trilha.
Edgard:
Sim, a ideia é fazer em todo o parque, para que ele todo tenha este
tipo de sinalização, acreditamos que isso mudaria um pouco a cara
do Parque.
P.
BV em Dia 7) Qual a importância do Parque para a região, e para a
população que vive em seu entorno?
Edgard:
A Área colabora, principalmente, com o clima local, pois quem mora
no entorno do Parque a temperatura é bem mais amena, a diferença em
graus em relação ao centro de Nova Iguaçu, por exemplo, é de 3°c,
bastante significativo, e com a questão do o abastecimento de água
para famílias que residem no bairro K-11, antes da criação do
Parque essa água tinha esgoto, devido aos 32 sítios aqui dentro
jogando esgoto no rio, e com a criação do Parque essa população
hoje vai ter uma água praticamente pura, porque não há mais esgoto
sendo despejado.
Patrícia:
Essa recuperação foi com intervenção da Administração Parque ou
naturalmente?
Edgard:
Foi naturalmente, pois a partir do momento que você não joga mais
esgoto dentro do rio, a água se renova.
Henrique:
Inclusive reparamos isso que você está falando, Edgard. Na parte
mais baixa, já na Coréia, perto do posto de saúde, a água já
estava bastante degradada, e conforme você vai subindo, a água vai
ficando mais limpa.
Edgard:
Sim, e ali também você consegue ver a pressão que a unidade sofre,
parece que as casinhas estão querendo subir, entrar e já pular para
a unidade. O pessoal quer isso, morar cada vez mais próximo da
floresta. Quando eles começarem a criar esta relação, do bem estar
que a floresta proporciona, vão querer fazer o maior uso possível.
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Flávia Lopes